Lida no encerramento da 3ª Caravana do Bem Viver, realizada entre os dias 16 e 20 de outubro na cidade do Rio de Janeiro, carta destaca desafios comuns de ambas as instituições para a promoção de Territórios Sustentáveis e Saudáveis no contexto de povos e comunidades tradicionais.
E foi com a presença de movimentos sociais, instituições de pesquisa e órgãos de governo, ocupando a Fiocruz, que encerramos mais uma bem-sucedida edição das Caravanas do Bem Viver no Rio de Janeiro. Foram mais de dez atividades em 5 dias intensos de trocas e aprendizado, nos quais avançamos juntos no diálogo entre saber científico e tradicional para a promoção da saúde e do desenvolvimento sustentável. A todas e todos que participaram, nosso muito obrigado!
Idealizada pela Fiocruz e pelo Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT) por meio do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), a 3ª Caravana do Bem Viver foi realizada em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Estadual Paulista (Unesp) com coordenação da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz (VPAAPS).
Confira a carta final do encontro e venha com a gente! Convidamos todos os nossos parceiros e parceiras para que sigam irmanados em nossa luta e contribuam com seus saberes para a construção do Bem Viver e de uma sociedade mais justa.
Obrigado!
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CARTA "Caravanas do Bem Viver: do encontro de saberes à transformação da realidade"
"A Terceira Caravana do Bem Viver, realizada de 16 a 20 de outubro na sede da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, promoveu uma potente interação entre saberes tradicionais e científicos em defesa da democracia, dos direitos sociais, da promoção da saúde única, da justiça socioambiental e do Bem Viver.
Em consonância com as Teses do 9º Congresso Interno da Fiocruz, a Caravana do Bem Viver reforça a importância da participação dos movimentos populares, indígenas, quilombolas, camponeses, caiçaras, considerando a diversidade étnico-racial e de gênero na construção das políticas públicas nacionais e na defesa do SUS.
Há uma firme posição da Fiocruz com relação à centralidade da Agenda 2030 para a promoção de uma saúde multissetorial, transdisciplinar, transcultural, integrada e unificadora que visa a equilibrar e otimizar de forma sustentável a saúde de pessoas, animais e ambientes. O 18º Objetivo do Desenvolvimento Sustentável proposto pelo Presidente Lula, traz a promoção da igualdade racial para o cerne das discussões que irão embasar as políticas públicas nos próximos anos e os frutos da parceria FCT-Fiocruz será fundamental para que o país proponha os próximos objetivos para o desenvolvimento das Nações Unidas para além de 2030, incorporando os temas do Bem Viver, da justiça socioambiental, da educação diferenciada e dos modos de vida tradicionais.
A luta da vida dos povos tradicionais é manter sua ancestralidade a partir da gestão do território onde vivem. Porém, as centenas de comunidades tradicionais quilombolas, indígenas e caiçaras da Bocaina e da Costa Verde, excluídas dos processos de desenvolvimento hegemônicos históricos que tentam insidiosamente as expulsar de seus territórios tradicionais, compreenderam que o fortalecimento de sua luta depende de tecer redes de apoio e solidariedade entre os Movimentos e com parcerias estratégicas com a Fiocruz, CPII, UFF, UNESP, UFRJ, Universidade de Coimbra, entre outras, que são fundamentais para que as comunidades possam trilhar os caminhos dos direitos garantidos.
O Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), parceria entre o Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba (FCT) e a Fiocruz, vem se firmando, ao longo desses quinze anos, como um espaço tecnopolítico de governança territorial e inovação científica e tradicional, nutrida pela ecologia de saberes e pela pedagogia da autonomia. Nosso objetivo central é criar, comunitários e acadêmicos juntos, propostas e soluções que reforcem a luta pela permanência dos povos e comunidades tradicionais em seus territórios e pela construção do Bem Viver.
Este caminho, tão grandioso quanto desafiador, tem transformado a forma de se fazer ciência dentro e fora da Fiocruz. Na mesma medida, também tem contribuído para o amadurecimento da luta e das estratégias do FCT, movimento social que se tornou referência e modelo para diversas experiências de mobilização política focada na defesa de territórios no Brasil e no mundo.
Passos importantes estão sendo gestados por esta aliança única entre uma instituição pública de ciência e o movimento popular. É sempre tempo de plantar e de colher! A parceria entre o FCT e Fiocruz, que gerou o OTSS, agora avança para a implantação de um campus avançado da Fiocruz em Paraty. Esta região, que concentra uma das maiores áreas contínuas preservadas da Mata Atlântica e intensos conflitos socioterritoriais, é um território de aprendizagem que se abre definitivamente para a cooperação tecno-política nacional e internacional com o novo campus que se anuncia.
Estamos construindo, para o próximo ano, o Encontro Internacional de Territórios e Saberes, evento que pretende juntar movimentos sociais, instituições de governo, povos originários, comunidades tradicionais e instituições de pesquisa de diversas partes do Brasil e do mundo, para compartilhar e aprimorar políticas públicas, tecnologias sociais e estratégias de incidência política que temos experimentado em nosso programa. Este encontro mira diretamente na construção de uma plataforma de propostas para serem levadas à Cúpula do Clima de 2025, a COP 30, que será realizada em Belém do Pará. Ali, vamos somar nossas vozes para a construção de alternativas social e territorialmente referenciadas, com respeito e protagonismo dos Povos e Comunidades Tradicionais, os verdadeiros guardiões das florestas e das águas!
Temos consciência de que vivemos agora uma janela de oportunidades para a afirmação de direitos e de avanços da luta dos Povos Originários e Comunidades Tradicionais. O novo Governo Lula reabre os caminhos da Democracia e do diálogo de saberes, tão fragilizados nos últimos anos pelo ódio, autoritarismo e negacionismo. Entendemos que é hora de avançar! Foi por esse motivo que nos deslocamos até Brasília, para levar nossas experiências e demandas a diversos órgãos de governos, instituições públicas e parlamentares.
Sabemos que Povos Originários e Comunidades Tradicionais desenvolveram formas de manejo que garantem, em seus territórios de terra, mar, rios e florestas, níveis de preservação ambiental acima da média mundial, e que isto, em tempos de crise climática, é um serviço que beneficia a todo o globo. Sabemos também, em contrapartida, que estas comunidades são atacadas pelo racismo ambiental, perpetuado por forças que se movem por interesses predatórios, de lucro e de acumulação de bens e riquezas. Por isso, nossa estratégia política mira na promoção da Justiça Socioambiental, o que passa pela promoção de políticas públicas sensíveis e adequadas às realidades específicas destas comunidades.
Nesse contexto, durante a 3ª Caravana do Bem Viver, tivemos a alegria de nos reunir com representações de mais de 10 ministérios e instituições federais para formatar o que estamos chamando de Grupo de Trabalho Intersetorial para discussão e desenvolvimento de Políticas Públicas Territorializadas no contexto de PCTs. Estiveram conosco os Ministérios da Saúde, Cultura, Educação, Pesca, Igualdade Racial, Desenvolvimento Social e Desenvolvimento Agrário, além de gestores do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e do Ibama. Esta articulação nascente, fruto direto de nossa semana de incidência em Brasília, contribuirá para a integração e diálogo das diferentes instituições governamentais e de pesquisa com os movimentos sociais e populares para assegurar direitos territoriais, sociais, culturais e socioambientais para nossas comunidades.
É hora de garantir a educação diferenciada, com uma regulação adequada e participativa! É hora de valorizar formas sustentáveis de ocupação do território e de promoção da saúde, por meio da alimentação saudável, do saneamento ecológico, da agroecologia, do turismo de base comunitária! É hora de salvaguardar as culturas tradicionais, as formas de fazer e de viver baseadas nos conhecimentos ancestrais transmitidos de geração a geração.
Para isso, é fundamental fortalecermos nossos laços de solidariedade e de luta! Aproveitamos esta Caravana para mais uma vez reunir nossos movimentos irmãos para juntos construirmos estratégias de defesa de nossos territórios: Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba, Fórum de Povos e Comunidades Tradicionais do Sergipe, Fórum de Povos e Comunidades Tradicionais do Vale do Ribeira, Coletivo de Associação de Moradores da Ilha Grande, Movimento de Mulheres Camponesas, Rede de Mulheres Produtoras Agroecológicas, Fórum em Defesa dos Pescadores da Baía de Sepetiba, Movimento das Marisqueiras de Sergipe, União dos Atingidos de São Sebastião, Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos, Coordenação Nacional de Comunidades Tradicionais Caiçaras, Rede Agroecológica de Mulheres Agricultoras, Comissão Guarani Yvyrupa.
Convidamos todos os nossos parceiros para que sigam irmanados em nossa luta e contribuam com seus saberes para a construção do Bem Viver e de uma sociedade mais justa. Sendo o SUS uma conquista da luta popular e uma importante política de enfrentamento das desigualdades sociais, a experiência da Bocaina torna-se uma importante estratégia de cooperação interinstitucional de base territorial, realizada de maneira compartilhada com os povos tradicionais, capazes de enfrentar as determinantes sociais da vida e da saúde e de promover territórios sustentáveis e saudáveis de uma forma ampliada, crítica e eficaz.
Somente uma visão de saúde crítica, consciente e participativa com o Bem Viver pode garantir a defesa dos territórios tradicionais, contemplando o uso de tecnologias sociais e de práticas e culturas tradicionais para a promoção da sustentabilidade e da saúde única a partir da ecologia de saberes e da governança viva".
Rio de Janeiro, 20 de outubro de 2023
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