FCT avança contra leilão de terras que ameaça comunidades tradicionais em Paraty (RJ)
- Juliana Santos
- 1 de jul.
- 3 min de leitura
Em diálogo com o Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT), Defensoria Pública do Estado, Ministério Público Federal e Advocacia-Geral da União recomendam a suspensão do leilão que coloca em risco mais de 400 famílias caiçaras moradoras de territórios ancestrais

Em maio, alguns moradores de comunidades tradicionais de Paraty foram surpreendidos, via redes sociais, com links do leilão de 32 lotes sobrepostos a territórios tradicionais caiçaras. O Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT), então, iniciou a atuação direta em defesa das comunidades afetadas: enviou ofícios ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e à Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e pediu apoio à Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPE-RJ) e ao Ministério Público Federal (MPF), que se manifestaram em conjunto no processo judicial que deu origem aos leilões. E recomendam a suspensão das emissões de posse. Depois, a União também se manifestou, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), com parecer alinhado, já que muitas áreas leiloadas estão em terrenos públicos.
Uma série de protestos e manifestações foram realizadas em Paraty até que, no dia 24 de junho, mais de 70 representantes de nove comunidades caiçaras se reuniram em encontro convocado pelo FCT e a DPE-RJ. As defensoras públicas Renata Jardim da Cunha Rieger e Juliana de Albuquerque França reafirmaram, no encontro, o compromisso da Defensoria com a tutela coletiva e destacaram a importância da mobilização popular organizada.
Comunidades presentes:
Ilha do Araújo
Ilha do Cedro
Ilha do Algodão
Saco do Mamanguá
Saco Claro
Saco da Sardinha
Bijiquara
Paraty Mirim
Rio Pequeno
:: Principais pontos levados às autoridades pelo FCT:
Denúncias de assédio por parte de arrematantes/compradores, mesmo após a suspensão judicial. A orientação é: documentar e denunciar.
Erros e inconsistências nos mapas e memoriais descritivos dos lotes, confirmados por agrimensor presente na reunião.
Coleta de documentos, fotos e certidões para compor um laudo antropológico e fortalecer a defesa territorial.
O ICMBio se colocou à disposição para colaborar tecnicamente na regularização fundiária coletiva.
No mesmo 24 de junho, a advogada da União Fabiana Silva da Rocha destacou uma série de indícios de irregularidades no processo judicial que inclui o inventário do espólio de José Maria Rollas, iniciado em 1988. E solicitou --alinhada à decisão anterior da DPE-RJ e do MPF-- a suspensão imediata dos leilões, arrematações, imissões na posse e registros cartoriais, até que a situação seja esclarecida e os direitos coletivos das comunidades sejam garantidos. Algumas irregularidades apontadas pela AGU:
Vários lotes estão localizados em áreas da União, como ilhas, terrenos de marinha e acrescidos de marinha;
Ausência de georreferenciamento técnico, sem memorial descritivo nem ART (Anotação de Responsabilidade Técnica);
Utilização de registros cancelados judicialmente como base para o leilão;
Sobreposição com unidades de conservação federais, como a APA Cairuçu e o Parque Nacional da Serra da Bocaina;
Lotes leiloados incluem áreas com TAUS (Termos de Autorização de Uso Sustentável) ativos, como na Ilha do Cedro.
Impacto nas comunidades
Os lotes leiloados estão em territórios ocupados há mais de 200 anos por famílias caiçaras. Estimativas locais apontam que:
60% dos 750 moradores da Ilha do Araújo correm risco de remoção;
75 famílias do Saco do Mamanguá também estariam ameaçadas;
Leilões ocorreram sem delimitação clara e sem consulta às comunidades, violando o direito à consulta prévia, livre e informada, garantido pela Convenção 169 da OIT.
O FCT segue na luta pela justiça territorial, em parceria com DPE-RJ, AGU, MPF, SPU, ICMBio e movimentos locais.
A defesa do território não é só sobre terra. É sobre história, cultura, memória e o modo de vida caiçara. Nenhum território a menos.
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Por Juliana Vilas
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