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Praia da Almada avança na defesa do território com Termos de Autorização de Uso Sustentável (TAUS)

Ação garante à comunidade segurança para o uso e gestão de duas áreas muito importantes: o estacionamento da comunidade, onde também se realiza o Festival do Camarão, e o espaço cultural na praia do Engenho, onde se realizam reuniões e atividades da Associação de Moradores. Objetivo agora é conquistar novos TAUS para a Ilha dos Porcos (Ilha da Almada), praia da Lança Cavala e praia Brava da Almada.



No último dia 20 de julho de 2023, um marco histórico para a comunidade caiçara da Praia da Almada foi alcançado: a entrega oficial de dois Termos de Autorização de Uso Sustentável (TAUS). Um se refere à área do estacionamento da comunidade, onde é realizado o Festival do Camarão e outro do Espaço Cultural Caiçara na Praia do Engenho.


O TAUS é um instrumento social utilizado para regularizar áreas de domínio da união na qual são residentes comunidades tradicionais. Segundo o Ministério da Economia: “O TAUS é conferido em caráter transitório e precário, para comunidades tradicionais, com o objetivo de possibilitar a ordenação do uso racional e sustentável dos recursos naturais disponíveis na orla marítima e fluvial, voltados à subsistência dessa população. A autorização compreenderá áreas utilizadas tradicionalmente para fins de moradia e uso sustentável dos recursos naturais. A concessão de TAUS é regulamentada pela Portaria SPU nº 89, de 15 de abril de 2010.”


O processo que culminou nessa grande conquista teve início em 2014, quando Maria Aparecida de Souza, a dona Cida, tomou conhecimento da existência do documento que poderia assegurar às comunidades tradicionais as condições para garantirem seus territórios e manterem suas atividades preservadas. "Quando eu soube que existia o TAUS, me trouxe uma esperança de que a nossa praia não poderia ser vendida", relembra Dona Cida.


Para celebrar, uma cerimônia emocionante foi realizada na abertura do 28ª Festival do Camarão da Almada, tornando o momento ainda mais especial e significativo para a comunidade. A entrega dos TAUS foi em meio a um clima festivo e repleto de orgulho, simbolizando a conquista de direitos fundamentais para a preservação da cultura caiçara.



Vagner Nascimento, membro da coordenação do Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT) e coordenador geral do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), reafirmou em sua fala a importância histórica deste registro. "É o primeiro TAUS coletivo continental, isso é um feito histórico para nós dos movimentos de comunidades tradicionais", celebrou.


Na ocasião, o presidente da Associação de Moradores da Almada-AMA, Márcio Roberto dos Santos, o “Chico da Almada”, emocionou a todos ao ressaltar a importância da luta coletiva para a conquista dos TAUS e destacou a relevância da própria Associação como espaço de organização política. "Não existe luta sem a participação ativa da comunidade. Por mais que a gestão da associação mude, é fundamental que estejamos sempre empenhados em dar continuidade às articulações que fortalecem a nossa luta", afirmou sob aplausos calorosos dos presentes.


O longo caminho para a efetivação do TAUS foi marcado por desafios e esforços incansáveis da comunidade local para preservar suas tradições e modos de vida ligados ao mar e à terra. A partir do momento em que dona Cida descobriu a possibilidade de obter o Termo de Autorização de Uso Sustentável, ela mobilizou sua comunidade para embarcar nessa jornada rumo à proteção da cultura caiçara e consequentemente da natureza do seu território.


O processo de solicitação do TAUS envolveu diversos órgãos governamentais e especialistas no assunto. Foram anos de diálogo, estudos de viabilidade e levantamentos socioambientais, que visavam comprovar a relevância da Praia da Almada para a manutenção da cultura tradicional local. Pois são as comunidades tradicionais e os povos originários que através de suas práticas ancestrais garantem a preservação da biodiversidade local, como comprovam diversas pesquisas.


Chico reforçou a importância da caracterização feita pelo Projeto Povos, trabalho todo construído junto com a comunidade, registrando em mapas seu território e suas práticas ancestrais, além de suas histórias, memórias e visão de mundo, sendo um instrumento de luta pela permanência com protagonismo em seu território e contra as violências da especulação imobiliária e do turismo desenfreado. "Fizemos nossa reintegração de posse, defendendo com unhas e dentes nosso território e nossos meios de subsistência".



"Ainda que não seja uma regulamentação fundiária definitiva, o Taus é um passo importante para defesa deste território" explicou Tathiana Duarte, advogada do FCT e pesquisadora do OTSS.


Histórico


O processo de solicitação do Termo de Autorização de Uso Sustentável pela comunidade de pescadores iniciou-se em 2015. Em 2021, o Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT) intensificou sua atuação de apoio à luta da Associação de Moradores da Almada (AMA) para conseguir o TAUS das duas áreas, com 1.563,32m² e 744,95m² respectivamente. Em fevereiro, a Secretaria de Patrimônio da União-SPU, efetivou o TAUS por meio da publicação de uma Portaria de Declaração de Interesse do Serviço Público (PDISP), em benefício de cerca de 40 famílias representadas pela associação.


A sessão de entrega do TAUS para a comunidade de Ubatuba pela SPU marca também a retomada das atividades de análise de concessão deste instrumento a outras comunidades da região. O documento é importante para garantir maior segurança jurídica às comunidades durante tratativas processuais para concessão de um título mais efetivo e em situações de conflitos de terras.Os direitos de utilização dos bens imóveis da União, sejam construções, terras, águas ou florestas públicas podem ser destinados pela SPU a agentes públicos ou privados, visando efetivar a função socioambiental desse patrimônio, em harmonia com os programas estratégicos para a população. Há diferentes instrumentos para realização dessa transferência de direitos, sendo a TAUS um desses instrumentos de destinação do patrimônio da União.


A promotora do Ministério Público Federal (MPF) Walquiria Picoli lembrou quando iniciou o acompanhamento de reintegração da área onde acontece o Festival do camarão, em 2017. "Não foi fácil o processo de reintegração de posse. Estamos sempre lutando contra pessoas e corporações que detêm poder e influência". A promotora reforçou que a abrangência do TAUS precisa contemplar o maretório, "Conseguimos o TAUS para o continente, mas precisamos introduzir e avançar na defesa do maretório. O processo do TAUS precisa ser sustentado pela comunidade, com um engajamento coletivo, neste sentido a Almada é uma inspiração".


A conquista dos TAUS pela comunidade caiçara da Praia da Almada é um exemplo inspirador de como a união, a perseverança e o compromisso com a sustentabilidade podem transformar realidades e garantir um futuro mais promissor para as gerações presentes e futuras. "A entrega do TAUS para a comunidade da Almada inspira a luta e a busca das demais comunidades pelo seu direito" celebrou Marcela Cananéia, que integra a Coordenação Nacional de Comunidades Tradicionais Caiçaras (CNCTC), faz parte também da coordenação do Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT) e é coordenadora de justiça socioambiental do OTSS.



O encontro, além de celebrativo, também contou com as falas de lideranças de outras comunidades, que aproveitaram a ocasião e presença das instituições públicas para fazer denúncias e cobrar esclarecimentos sobre as diferentes situações de invasões que acontecem em seus territórios. Vaguinho, da comunidade de São Gonçalo, alertou que "precisamos olhar para as documentações expedidas que privatizam e degradam o nosso território. Fazer a reintegração de posse deste território como um todo".


Diante das comunidades presentes, Eric Mazzo, da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), reforçou que "Cabe à administração pública aplicar esses instrumentos de defesa dos territórios e comunidades, ainda que seja um exercício de paciência".


Nas palavras da secretária-executiva do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Cristina Mori, "Em 2004 foi reconhecido que as comunidades tradicionais eram fundamentais para a preservação das áreas da União. A comunidade da Almada sempre resistiu, se o TAUS chega hoje, é por causa dessa luta coletiva. O poder econômico não pode determinar e condicionar a existência e a permanência dos povos tradicionais. O TAUS é do povo e cabe ao poder público equilibrar essa balança dos interesses econômicos com os das comunidades tradicionais".


Para Santiago Bernardes, também da coordenação do FCT, o recebimento dos TAUS não representa o fim da caminhada, mas sim mais um passo significativo na luta pelos direitos territoriais das comunidades tradicionais. "O exemplo da Almada precisa ser encarado como um modelo a ser seguido por outras comunidades que estão buscando meios de garantir suas raízes culturais e seus direitos sobre o território que habitam", ressaltou Santiago.


No início da luta, a comunidade pleiteava também o TAUS para a Ilha dos Porcos (Ilha da Almada), a praia da Lança Cavala e a praia Brava da Almada. Importante seguir nessa construção para assegurar seus direitos sobre seu território como um todo.


Uma ação muito importante em curso pelo Fórum de Comunidades Tradicionais-FCT é a construção de uma agenda com a Secretaria de Patrimônio da União-SPU para tratar da pauta do TAUS em todo o território de atuação do movimento, ampliando a abrangência do instrumento e contemplando mais comunidades tradicionais.


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Textos: Maitê Freitas e Santiago Bernardes


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