CBA 2025: Territórios tradicionais ocupam o Congresso Brasileiro de Agroecologia
- Caroline Nunes 
- há 1 dia
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“A sistematização não é só escrever; ela acontece quando refletimos coletivamente sobre a nossa prática”, avalia coordenadora da Incubadora, Sidélia Silva

Entre os dias 15 e 18 de outubro, Juazeiro (BA) recebeu o 13º Congresso Brasileiro de Agroecologia, reunindo experiências de todo o país em torno de uma ciência que nasce no encontro entre os saberes dos territórios, a produção acadêmica e a luta social.
Criado em 2003, o CBA se consolidou como um dos principais espaços de diálogo e convergência entre agricultoras e agricultores familiares, povos indígenas, caiçaras e quilombolas, pesquisadores, estudantes, organizações e movimentos sociais comprometidos com a construção de uma agricultura mais justa, ética e sustentável.
Mais que um evento científico, o Congresso mobiliza processos territoriais, fortalece redes, sistematiza conhecimentos que orientam políticas públicas e reafirma a agroecologia como caminho central para enfrentar crises climáticas, socioeconômicas e de saúde.
Cada edição é também um chamado para o fortalecimento da soberania alimentar e a valorização de práticas, culturas e modos de vida que mantêm vivas as relações entre alimento, território e cuidado.
Neste ano, a Incubadora de Tecnologias Sociais (ITS) do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS) marcou presença em uma caravana diversa e potente da Costa Verde, reunindo juventudes, lideranças comunitárias e iniciativas que integram saberes e tecnologias nos territórios. Ao longo de quatro dias intensos, o grupo compartilhou experiências, ampliou parcerias e voltou para casa com novos compromissos na bagagem.
Para contar como foi essa participação, Sidélia Silva, coordenadora da Incubadora, descreveu ao OTSS como foi a experiência. Na entrevista a seguir, ela reflete sobre aprendizados, articulações e a força das redes no avanço da agroecologia no Brasil.
OTSS: Conta um pouco da composição da caravana da Costa Verde que veio para o CBA este ano.
Sidélia: A gente vem acompanhando o Congresso Brasileiro de Agroecologia há um tempo, tanto pelo Fórum de Comunidades Tradicionais quanto pelo Observatório. Dessa vez, a gente avaliou que o CBA é um espaço formativo muito importante, principalmente para a juventude do território.
Tem uma galera jovem que já está no limiar de se tornar liderança e precisa de contato com experiências e ferramentas para avançar. Então, priorizamos a participação dessa juventude.
Também trouxemos a Cozinha das Tradições, que nasceu como um desdobramento do último CBA, para seguir se fortalecendo e trocando com outras mulheres. E trouxemos ainda as frentes da Incubadora de Tecnologias Sociais: Saneamento Ecológico, Pesca Artesanal, Agroecologia e Turismo de Base Comunitária.
É um espaço muito potente para dialogar com outras iniciativas, conhecer experiências e articular redes.
A ideia foi desenvolver melhor nosso trabalho em rede, articulados com a Aliança dos Povos e Comunidades Tradicionais em Defesa da Mata Atlântica. Inclusive, já extrapolamos o trabalho em apenas sete municípios, porque essa rede tem ampliado nossa atuação e enriquecido tudo que fazemos.
OTSS: Quantas pessoas vieram neste grupo?
Sidélia: Veio um ônibus com 40 pessoas e mais algumas de avião. No total, chutando por alto, umas 50 pessoas. E nem todas voltam para o território agora, porque tem um grupo que segue direto para Sergipe para o Encontro Nacional de Fóruns.
OTSS: E qual foi a proporção entre comunitários e equipe técnica?
Sidélia: Setenta por cento comunitários. A gente privilegiou a participação da juventude, da Cozinha das Tradições e das lideranças que atuam nas frentes da Incubadora.
Hoje, inclusive, boa parte da nossa assessoria já é formada por pessoas do próprio território. Então, mesmo quem vem como assessoria está profundamente enraizado na comunidade.
OTSS: Mesmo num cenário de poucos recursos e com o CBA acontecendo longe da Costa Verde, vocês escolheram estar aqui com força. O que explica essa prioridade?
Sidélia: O CBA é um espaço riquíssimo de construção e diálogo entre movimentos sociais e academia, exatamente o que o Observatório faz há anos. Só que aqui a gente consegue algo raro: refletir coletivamente sobre a nossa prática.
A sistematização não é só escrever. Ela acontece quando relembramos nossos registros e analisamos junto com outras experiências, para enxergar desafios, melhorias e caminhos possíveis.
Além disso, tem uma camada institucional muito presente. O governo, universidades, instituições… todos ouvindo o acúmulo de relatos dos territórios. Isso gera um recado muito claro sobre a necessidade de políticas públicas mais coerentes e acessíveis. Porque existem vários programas voltados aos territórios, mas nem sempre chegam de fato ao povo. O CBA ajuda a mostrar isso com força.
OTSS: Dentro de tanta atividade acontecendo ao mesmo tempo, o que mais te marcou nesta edição?
Sidélia: Cinco coisas ficaram muito fortes para mim. Primeiro, a presença dos povos de terreiro, muito organizados e dialogando com a academia de forma potente.
Depois, o movimento das mulheres, com redes produtivas muito consolidadas. Terceiro, a presença indígena, com muitas aldeias articuladas aqui.
A quarta coisa tem tudo a ver com nossa realidade: a pesca artesanal. Ela ainda não é tão debatida no CBA, mas já vemos um movimento dos pescadores para ocupar esse espaço.
A pesca tem muitas convergências com a agroecologia e merece esse debate. Ver isso ganhando força me alegrou demais.
A quinta é a presença ativa de instituições, ONGs e governos — ministérios, secretarias e assessorias das três esferas participaram e coordenaram atividades voltadas ao aprimoramento das políticas públicas. Foi significativo perceber o quanto essas instâncias estão atentas às demandas dos territórios e dispostas a dialogar com elas.
Por Caroline Nunes



























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